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sexta-feira, 5 de agosto de 2016

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ICTERÍCIA | Neonatal e adulto

A icterícia é um sinal clínico que se caracteriza pela cor amarelada da pele, mucosas e olhos. Ela surge quando há excesso de uma substância chamada bilirrubina no sangue.

Antes de falar da icterícia propriamente dita, é importante gastar algumas linhas explicando o que é a bilirrubina e por que ela se acumular no sangue.

O que é bilirrubina?

Nossas hemácias (glóbulos vermelhos) têm uma vida média de 120 dias. Quando elas ficam velhas, são levadas para o baço, onde são destruídas. Um dos produtos liberados neste processo é a bilirrubina, um pigmento amarelo-esverdeado.

Todos os dias, milhões de hemácias são destruídas e toda essa bilirrubina liberada tem que ser metabolizada em algum outro sítio, já que o baço não efetua essa função. O grande órgão responsável pelas metabolizações das substâncias do nosso organismo é o fígado, e é para lá que são encaminhadas toda a bilirrubina recém-formada no baço.

O único meio de transportar qualquer substância pelo corpo é através da circulação sanguínea. A bilirrubina produzida no baço não se dilui na água. Deste modo, para ser transportada pelo sangue ela precisa se ligar a uma proteína chamada albumina. Em uma analogia bem grosseira, poderíamos dizer que a bilirrubina não sabe nadar e precisa de uma canoa para atravessar a corrente sanguínea.

Essa bilirrubina insolúvel produzida no baço é chamada de bilirrubina indireta (ou bilirrubina não conjugada). Sua concentração sanguínea normal varia entre 0,1 e 0,6 mg/dL.

Ao chegar ao fígado, a bilirrubina indireta é metabolizada e se transforma em uma substância solúvel em água, chamada agora de bilirrubina direta (ou bilirrubina conjugada). Essa bilirrubina direta é eliminada através das vias biliares em direção ao trato gastrointestinal, onde será eliminada nas fezes. A bilirrubina direta após cair nos intestinos é mais uma vez metabolizada, agora pelas bactérias ali presentes, tornando-se um pigmento de coloração marrom responsável pela cor característica das nossas fezes.

Uma pequena parte da bilirrubina produzida no fígado extravasa para a corrente sanguínea. A concentração normal de bilirrubina direta no sangue varia entre 0,1 e 0,4 mg/dL. Essa bilirrubina direta diluída no sangue é filtrada pelos rins e eliminada na urina. Parte da coloração amarelada da urina se dá pela presença de pequenas quantidades de bilirrubina na mesma.

Portanto, os valores normais de bilirrubina sanguíneos nos adultos são os seguintes:
Bilirrubina total: 0,2 a 1,1 mg/dL
Bilirrubina indireta: 0,1 e 0,7 mg/dL
Bilirrubina direta: 0,1 a 0,4 mg/dL

Obs: esses valores podem variar um pouco dependendo do laboratório e do método usado para medição. Se quiser saber mais sobre marcadores de doença do fígado, leia: O QUE SIGNIFICAM AST (TGO), ALT (TGP) E GAMA GT?

A icterícia surge quando, por algum motivo, ocorre um acúmulo de bilirrubina direta e/ou indireta, no sangue. Quando as concentrações de bilirrubina ultrapassam 1,5 a 2,0 mg/dL, esse excesso de pigmento extravasa em direção à pele, mucosas e à membrana que recobre a esclera (parte branca dos olhos), levando a característica aparência amarelada da icterícia.

Causas de icterícia

A icterícia surge, basicamente, quando há uma produção excessiva de bilirrubina e/ou quando há uma eliminação deficiente da mesma. A icterícia neonatal ocorre pelos dois motivos e será abordada separadamente na parte final do texto.

Icterícia por aumento de bilirrubina indireta

A bilirrubina indireta pode se acumular quando há uma grande destruição da hemácias – além daquela considerada normal -, jogando na circulação sanguínea uma quantidade de bilirrubina maior do que a capacidade do fígado de excretá-la.

Essa destruição é chamada de hemólise e pode ocorrer por vários motivos:

– Uso de drogas (ribavirina, benzocaína, dapsona, fenazopiridina, paraquat, gás arsênico, chumbo, etc.).
– Infecções como malária e leptospirose (leia: SINTOMAS DA LEPTOSPIROSE).
– Defeitos na própria hemácia como na esferocitose hereditária, hemoglobinúria paroxística noturna, anemia falciforme (leia:  ANEMIA FALCIFORME (DREPANOCÍTICA)), talassemia etc…
– Doenças auto-imunes (leia: DOENÇA AUTO-IMUNE).

O acúmulo de bilirrubina indireta também pode ocorrer por incapacidade do fígado em conjugar a mesma em bilirrubina direta. A síndrome de Gilbert e a síndrome de Crigler-Najjar são duas doenças genéticas que podem causar icterícia por deficiência da enzima do fígado responsável pela conjugação da bilirrubina (leia: SÍNDROME DE GILBERT, CRIGLER-NAJJAR e DUBIN-JOHNSON).

Icterícia por aumento de bilirrubina direta

A icterícia por bilirrubina direta ocorre quando o fígado consegue conjugar a bilirrubina, mas por algum motivo não consegue excretá-la em direção aos intestinos. Entre as principais causas podemos citar:

– Hepatites virais (leia: AS DIFERENÇAS ENTRE AS HEPATITES)
– Esteatose hepática grave (leia: O QUE É ESTEATOSE HEPÁTICA?)
– Cirrose hepática (leia: CIRROSE HEPÁTICA)
– Cirrose biliar primária
– Obstrução das vias biliares por cálculos
– Câncer do fígado ou das vias biliares
– Câncer do pâncreas com obstrução das vias biliares

Sinais e sintomas clínicos associados à icterícia

Além da pele e dos olhos amarelados, a icterícia costuma acometer também as mucosas. O freio da língua é outro ponto onde pode-se notar o pigmento amarelado da bilirrubina.

Icterícia – pele amarelada

A deposição do pigmento na pele, além de ser responsável pela coloração amarelada, também causa um comichão intenso. Muitas vezes o paciente se queixa mais da coceira do que da própria alteração de cor da pele.

Quando a icterícia é de origem direta, ou seja, devido a bilirrubina solúvel em água, podemos ter mais 2 achados típicos:

Colúria:  quando há muita bilirrubina direta no sangue, há consequentemente muita bilirrubina sendo filtrada pelos rins. O resultado é uma urina cor escura (tipo Coca-Cola) ou com um alaranjado forte, causado pelo excesso de pigmento na mesma. Como a bilirrubina indireta não é solúvel na água, ela não é filtrada pelo rim, por isso, não há colúria nestes casos de icterícia.

Acolia fecal: quando ocorre algum impedimento na excreção da bilirrubina conjugada para os intestinos, o paciente pode apresentar fezes muitos claras, por vezes, quase brancas, devido a ausência de pigmento na mesma.

Icterícia neonatal

A icterícia neonatal ou icterícia do recém-nascido é uma condição comum, principalmente e bebês nascidos antes de 36 semanas.

Na maioria do neonatos  a icterícia é um fenômeno normal e esperado. Os níveis de bilirrubina indireta do recém-nascidos é naturalmente mais elevada do que nos adultos. Isto ocorre por 2 motivos:

– As hemácias dos recém-nascidos apresentam uma vida média mais curta do que as dos adultos. Além disso, os neonatos também apresentam uma concentração de hemácias mais elevada. O resulta final é uma quantidade muito maior de hemácias precisando ser destruídas e uma maior quantidade de bilirrubina sendo lançada na circulação.
– O fígado do recém-nascido é imaturo e sua capacidade de conjugação e excreção da bilirrubina é limitada.

A icterícia dita fisiológica (normal) é aquela que inicia-se ao redor do 3º dia de vida e desaparece em até 2 semanas. Em bebês prematuros ela pode demorar um pouco mais.

Os níveis de bilirrubina podem chegar ao redor de 15 mg/dL.

Quando a icterícia neonatal preocupa?

Apesar de ser muito comum, a icterícia em recém-nascidos pode ser preocupante, não só por poder indicar a presença de alguma doença, mas também por causar lesões no sistema nervoso central quando em níveis muito elevados.

A icterícia não deve ser considerada fisiológica quando:
– Inicia-se antes nas primeiras 24h.
– Apresenta concentrações sanguíneas acima de 20 mg/dL.
– Quando demora mais de 2 semanas para desaparecer (exceto em prematuros).
– Quando a bilirrubina direta também está muito elevada.

A icterícia que não apresenta características de fisiológica pode indicar que o recém-nascido tenha problemas do fígado, das vias biliares, hemólise ou qualquer outra doença que cause elevação das bilirrubinas.

Kernicterus

Kernicterus é o nome dado a encefalopatia (lesão do sistema nervoso central) causada pelo acúmulo de bilirrubina no cérebro. Ocorre principalmente quando há níveis de bilirrubina acima dos 25 mg/dL.

Os primeiros sinais clínicos de intoxicação pela bilirrubina incluem sonolência, diminuição do tônus muscular e recusa alimentar. Se não reconhecido, o bebê evolui para quadro de espasmos, choro inconsolável e febre.

Se o excesso de bilirrubina não for corrigido, o neonato pode evoluir para o Kernicterus, com lesão permanente do cérebro, cujo sintomas surgem após o primeiro ano de vida e incluem:

– Dificuldade em sentar, engatinhar e posteriormente andar
– Tremores e movimentos involuntários
– Alterações na audição e visão
– Retardo do desenvolvimento mental
– Alterações na arcada dentária

Icterícia do leite materno

Não sabe bem o causa, mas alguns neonatos apresentam icterícia relacionado a amamentação. A provável causa deve estar nas características químicas do leite de determinadas mães. A icterícia do leite materno pode ser uma causa para uma ictericia neonatal prolongada, uma vez que a mesma inicia-se ao redor da primeira semana e pode durar por até 3 meses.

Se o recém-nascido estiver se alimentando bem e mantendo o seu desenvolvimento normal, não há motivos para se interromper o aleitamento. A icterícia do leite materno é benigna e não acarreta em maiores problemas.

De modo oposto, a icterícia também pode surgir em recém-nascidos que não estejam sendo amamentados corretamente, sendo causada por um baixo aporte calórico para o bebê.

Tratamento da icterícia neonatal

Fototerapia

Como a imensa maioria dos recém-nascidos melhora espontaneamente da icterícia, o tratamento só é indicado em caso mais graves. Em geral, indica-se tratamento quando a bilirrubina se eleva acima dos 18 mg/dL a partir do 3º dia, ou acima de 12 mg/dL nas primeiras 24 horas.

A fototerapia é o tratamento mais utilizado para se baixar os níveis de bilirrubina.

O recém-nascido é colocado sob uma luz azul fluorescente que age quebrando a molécula de bilirrubina em pedaços, facilitando a sua excreção na urina e nas fezes.

A fototerapia é um procedimento muito seguro e usado há mais de 30 anos. Em geral, é o único tratamento necessário.

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