A tabela chinesa da gravidez, também conhecida como tabela chinesa do sexo do bebê, é uma técnica desenvolvida pela medicina tradicional chinesa, que supostamente teria a capacidade de prever o sexo do bebê, baseando-se no calendário lunar chinês.
A tabela chinesa ganhou muita popularidade com a Internet, havendo centenas de sites que indicam essa técnica para as grávidas curiosas em saber o sexo do seu bebê. Há também quem indique a tabela para os casais que ainda não engravidaram, mas querem ter a possibilidade de escolher o sexo do futuro filho(a). Os apologistas da tabela chinesa dizem que a técnica tem mais de 90% de eficácia. Alguns sites vão além e afirmam que a eficiência da tabela é de 99%.
Mas o que a ciência tem a dizer sobre a tabela chinesa? Existem estudos científicos sobre esse método? Se a tabela chinesa da gravidez é apenas um folclore, um mito, por que ela se tornou tão popular na Internet?
Neste artigo vamos falar especificamente sobre a tabela chinesa; se você procura informações sobre formas cientificamente comprovadas de saber o sexo do bebê durante a gravidez, leia o seguinte artigo: COMO SABER O SEXO DO BEBÊ ? É menino ou menina?
O que é a tabela chinesa da gravidez
Segundo reza a lenda, a tabela chinesa da gravidez teria sido usada pelos imperadores como guia para que eles pudessem escolher o sexo dos seus futuros filhos, garantindo assim que eles tivessem descendentes homens, o que lhes assegurava a continuidade da sua linhagem real.
Abaixo fornecemos um exemplo da tabela chinesa, conforme publicado anualmente pelo Almanaque dos Fazendeiros Chineses. Para utilizar a tabela chinesa é necessário o uso de algumas ferramentas, que servem para equiparar o calendário chinês com o nosso calendário gregoriano ocidental. Essas ferramentas são facilmente encontradas pela Internet. Essa tabela não foi concebida para ser usada com o nosso tradicional calendário (mais à frente explico algumas diferenças entre os calendários).
Dependendo da fonte na qual se pesquisa, a história da tabela chinesa costuma apresentar algumas diferenças importantes. Há pelo menos 3 versões distintas para a origem da tabela:
1- A versão mais elaborada da história diz que tabela chinesa para prever o sexo do bebê seria um gráfico originado na Dinastia Qing (1644-1912) que teria desaparecido no ano de 1900 no Palácio de Verão do imperador Guangxu depois que a Dinastia perdeu a guerra com a Aliança das Oito Nações no mesmo ano. Ao fim do confronto, a tabela original teria sido enviada à Inglaterra onde a monarquia britânica mantinha-a escondida como tesouro. Muitos anos depois, em 1972, em circunstâncias não esclarecidas, o papel apareceu na Áustria. Lá ele foi visto por um historiador chinês, que copiou o conteúdo e o publicou em um jornal de Taiwan. Desde então, o gráfico tem sido publicado anualmente pelo Almanaque dos Fazendeiros Chineses e está disponível nas salas de parto dos hospitais chineses.
2- Outra versão sobre a origem da tabela diz que o gráfico foi encontrado nas proximidades de Pequim, em um túmulo de família real da Dinastia Qing. O gráfico teria cerca de 700 anos de idade, sendo, portanto, anterior à Dinastia Qing.
3- Uma terceira versão conta que a tabela chinesa original foi encontrado em uma sala subterrânea de Cidade Proibida na Dinastia Qing. O gráfico teria sido concebido a partir da teoria do Yin Yang, dos 5 elementos (metal, água, madeira, fogo e terra) e do Pa Kua.
Apesar das diferentes histórias sobre a sua origem, todas as fontes concordam que a tabela se baseia na idade chinesa da mãe e no mês da concepção, sempre de acordo com o calendário lunar chinês, o que acarreta em algumas diferenças relevantes quando comparados com o nosso calendário ocidental gregoriano, que é baseado somente no sol.
Segundo algumas fontes, na China, o bebê já nasce com 1 ano de idade e completa 2 anos no dia do ano novo chinês, que costuma ser entre Janeiro e Fevereiro, sem uma data fixa anual.
Portanto, para que a tabela chinesa possa ser utilizada, é preciso antes descobrir qual é a idade da mãe segundo o calendário chinês. Em geral, exceto para as mulheres que nasceram em Janeiro e Fevereiro, a idade lunar chinesa é um ano acima da idade real. Por exemplo, se você nasceu em 30.08.1990 e engravidou em 20.09.2016, a sua idade real será 26 anos, mas a sua idade chinesa será 27. Por outo lado, se você nasceu em 25.01.1990 e engravidou em 20.09.2016, sua idade real e sua idade chinesa serão de 26 anos.
Problemas da tabela chinesa
À luz do conhecimento científico atual, há inúmeros problemas teóricos com a tabela chinesa; e nenhuma das fontes explica qual é a relação ou a lógica por trás do uso da idade da mãe e do mês da concepção na definição do sexo do bebê.
Qual seria a explicação racional para acreditarmos, por exemplo, que todas as mulheres com 30 anos que foram fecundadas no mês de Junho vão ter sempre bebês do sexo masculino? E qual é a razão para que mulheres com 21 anos só tenham chance de ter filhos homens, caso a concepção ocorra no mês de Janeiro?
Quando esse tipo de previsão, que foge ao bom senso e briga com a lei das probabilidades, é feita, esperamos que uma boa explicação seja fornecida, caso contrário, a utilização da tabela fica muito mais próxima da superstição do que da racionalidade.
Mas os problemas de fundamentos da tabela chinesa não se resumem a uma simples falta de explicações lógicas sobre o seu funcionamento. Há questões amplamente conhecidas que fazem com que a confiabilidade da tabela seja baixa. Vamos citar algumas delas:
1- O primeiro problema é saber exatamente o dia da concepção. Sabemos que a concepção na maioria dos casos não ocorre no dia da relação sexual. O espermatozoide consegue sobreviver por até 5 ou 6 dias dentro do trato reprodutor feminino. Portanto, uma mulher que teve relações no dia 29 de Abril, pode ter ovulado (e ter sido fecundada) somente no dia 4 de Maio. Isso implica dizer que todas as mulheres que tiveram relações na última semana de mês vão ter dificuldades de dizer quando foi realmente o mês da sua concepção (explicamos o período fértil com mais detalhes no artigo: PERÍODO FÉRTIL PARA ENGRAVIDAR).
E as mulheres que tiveram múltiplas relações nos últimos meses? Como saber o dia correto da concepção?
2- Sabemos que quem “define” o sexo do bebê é o espermatozoide masculino, que pode transportar o cromossoma sexual X ou Y. Se o espermatozoide que fecundar o óvulo tiver o cromossoma Y, o feto será homem; se tiver o cromossoma X, o feto será mulher. Na definição do sexo do bebê, a genética da mulher tem pouca ou nenhum influência, pois como o seu par de cromossomas são obrigatoriamente XX, elas só podem doar um cromossoma X para o seu filho(a).
Portanto, é estranho que a tabela chinesa só leve em conta a idade da mãe e o mês da concepção. De que forma esses dados poderiam decidir que tipo de espermatozoide vai ser o responsável pela fecundação?
Não é impossível que o organismo da mulher tenha alguma influência na escolha do espermatozoide, mas para que isso tenha alguma credibilidade, faz-se necessária alguma explicação plausível, de preferência baseada em dados científicos.
É interessante lembrar que a tabela foi supostamente concebida há vários séculos, numa época em que o conhecimento científico era muito pobre. Faz todo o sentido que os povo mais antigos imaginassem que, de alguma forma, era o organismo da mulher quem decidia o sexo do bebê.
3- Como explicar os casos de mulheres que têm gêmeos, cada um de um sexo diferente?
4- Se a tabela é realmente eficaz, como explicar que a linha sucessória dos imperadores chineses não seja composta exclusivamente por filhos homens ao longo da história?
O que dizem os estudos científicos sobre a tabela chinesa
Muitos websites que fazem apologia da tabela chinesa frequentemente descrevem o gráfico da seguinte forma: “apesar de não haver comprovação científica, a tabela apresenta impressionante taxa de acerto”.
Na verdade, há, sim, comprovação científica. O problema é que os estudos mostram exatamente o oposto, que a tabela não é confiável e apresenta uma baixa taxa de acerto. Portanto, o consenso científico existe e é de que a tabela não é confiável.
O estudo mais famoso e importante sobre a tabela chinesa foi feito na Suécia em 2010 (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20618730). Neste estudo, os pesquisadores levantaram os dados de cerca de 3,4 milhões de nascimentos ocorridos ente os anos de 1973 e 2006. Destes, os pesquisadores conseguiram obter dados confiáveis das mães em cerca de 2,8 milhões de casos. A taxa de acerto da tabela chinesa nesse grupo de 2,8 milhões de mulheres foi de aproximadamente 50%, ou seja, exatamente a taxa de eficácia esperada para qualquer teste que não funcione, como, por exemplo, tentar adivinhar o sexo do bebê através do cara ou coroa. E a taxa foi sempre ao redor de 50%, não importando a idade da mãe ou o mês da concepção.
Esse estudo sueco é o maior, mas não é o único. Há diversos estudos publicados sobre o efeito do calendário lunar sobre a gravidez, não só sobre o sexo do bebê, mas também sobre a data do parto, risco de complicações, evolução do bebê e aumento da fertilidade. Em todos eles não se conseguiu comprovar qualquer relação causal entre o calendário lunar e os resultados da gravidez.
Por que a tabela chinesa é tão popular na internet?
A tabela chinesa possui uma taxa de acerto de 50%. Isso significa que em 3 milhões de mulheres grávidas, ela vai acertar o sexo do bebê em 1.5 milhão. Portanto, mesmo com uma elevada taxa de erro, para 50% das pessoas que fizerem o teste, ele parecerá ser eficaz. Já a chance do teste acertar o sexo com 2 filhos é de 25%, ou seja, 750 mil mulheres num universo de 3 milhões de grávidas. Por isso, é tão comum encontrar relatos de mães que garantem que a tabela é realmente confiável.
Conclusão: a tabela chinesa é confiável?
Por tudo o que foi explicado até aqui, como era de se esperar, podemos concluir que a tabela chinesa para prever o sexo do bebê não possui nenhuma base teórica plausível e falhou ao ser testada de forma científica em um grupo imenso de mulheres. Aliás, até o momento, todos os estudos que tentam encontrar alguma relação entre as fases da lua e os resultados da gravidez não conseguiram sucesso.
Se você está grávida e deseja saber qual é o sexo do seu bebê, as formas mais confiáveis são o exame de sexagem fetal, que a partir da 8º semana de gestação tem mais de 99% de taxa de acerto, ou através do ultrassom fetal, que a partir da 14ª semana de gestação já consegue identificar a genitália do bebê.
Apenas como nota pessoal, o autor desse texto tem 3 filhas. A tabela chinesa errou o sexo em 2 delas.
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